sexta-feira, 16 de outubro de 2009

Tesouros no sofrimento

Há algum tempo atrás ouvi um pregador fazer a seguinte declaração: “existem tesouros ocultos no sofrimento”. Aquela frase ficou reverberando durante dias na minha mente. Como extrair coisas boas da dor, da angústia e da amargura? Apesar de rejeitarmos o sofrimento, somos forçados a lembrar das palavras de Jesus: “no mundo tereis aflições”. Além disso, não podemos esquecer que vivemos num planeta decaído e que somos frutos do pecado de nossos pais espirituais.

Por isso, abrindo um parêntese, rejeito veementemente qualquer doutrina que pregue “Venha para Jesus e pare de sofrer” ou que atribua ao diabo o sofrimento imposto aos servos do Senhor. Creio que, uma vez lavados pelo sangue do Cordeiro, a vida dos salvos pertencem, única e exclusivamente, a Deus e capeta algum tem poder sobre eles sem a permissão do Todo-Poderoso.

Mas, voltando ao tema em questão, fica a pergunta. Como buscar pedras preciosas no meio da dor, da perda, da agonia, da angústia, da tristeza, do fracasso e da amargura?

Com o passar dos dias, o Senhor foi trazendo à minha memória os tesouros descobertos e internalizados por muitos dos Seus profetas. Abraão, por exemplo, sofreu a dor lancinante de ter o seu filho da promessa, cujo nascimento esperou por longos vinte e cinco anos, pedido em sacrifício pelo próprio Deus. Dá para imaginar o conflito monstruoso que esse homem enfrentou? Confesso que eu teria sucumbido no exato momento em que ouvisse tal pedido ou teria preferido cravar na minha própria carne o cutelo antes de erguê-lo ameaçadoramente sobre minha filha.

Mas não foi isso que Abraão fez. Movido por uma confiança e obediência incondicionais a Deus, ele teria levado a termo o que lhe fora ordenado se não fosse à intervenção do anjo. Será que se ele não tivesse passado por esse sofrimento o seu nome ficaria gravado como o “pai da fé” e “amigo de Deus”?

José foi outro que passou por maus bocados. Depois de ser criado como um príncipe, foi vendido como escravo pelos próprios irmãos. Quem já foi traído conhece a dor gigantesca que ele experimentou. Quem perdeu todos os bens, conforto, segurança material e todo afeto dos que o amavam conhece o inferno que o filho predileto de Jacó enfrentou. E só quem, após sofrer todo tipo de dissabor, desprezo e humilhação, passou a ser exaltado, admirado, cortejado, aclamado e reverenciado por todos, inclusive pelos seus algozes, sabe o gosto que a vitória possui.

Moisés foi o único homem que, ainda em vida, contemplou a glória de Deus. Talvez tenha sido esse o seu tesouro oculto em meio às décadas de privações, sofrimentos, provações, dificuldades e murmurações que atravessou. Mas é intuitivo observar que os anos de lapidação tornaram o gago, tímido e inseguro Moisés num líder de mão forte, destemido e aguerrido, cujo corpo Deus conserva em segredo até os nossos dias.

E o que dizer de Jó? Ele é o protótipo do servo sofredor! Imaginem o quadro. Se encontrar, de uma hora para outra, desprovido de tudo, absolutamente tudo que tinha como mais valioso, desde suas posses, sua saúde, seus filhos, a admiração de sua esposa e a confiança de seus amigos. Por muito menos, nós já gritamos, nos achando injustiçados por Deus. Mas Jó, em meio a todo esse deserto (e que deserto!), faz uma confissão linda: “Eu antes Te conhecia de ouvir falar, agora os meus olhos Te veem”. Ele descobriu o seu tesouro entre os escombros das suas perdas.

Outro provado até o limite foi a apóstolo Paulo. Sofreu sede, fome, torturas, açoites, prisões e naufrágios. De perseguidor, passou a perseguido. Antes cortejado, agora era visto como escória. O próprio Deus, quando o chama para Si, afirma que Paulo muito sofreria pelo Seu nome. E, sem murmurar, Paulo suportou todas as provações, inclusive o tal “espinho na carne”, sempre glorificando ao Senhor nas suas fraquezas.

Quais os tesouros descobertos por Paulo no sofrimento? Deixemos que ele mesmo responda: “O que para mim era lucro isso considerei perda por causa de Cristo. Sim, deveras considero tudo como perda, por causa da sublimidade do conhecimento de Cristo Jesus, meu Senhor, por amor do qual perdi todas as coisas e as considero como refugo, para ganhar a Cristo e ser achado por ele” (Fp 3:7-9).

E aí, queridos irmãos? Quem se sente desafiado a buscar, examinar e escarafunchar nos areais dos seus desertos as preciosidades guardadinhas pelo Senhor?

Por Jeane Ralile

12 comentários:

Cláudio Melo disse...

Que belo texto.

Muito inteligente e inspirador.

Ninguém quer passar pelo sofrimento para descobrir esse tesouro, mas, em passando, estejamos atentos para não perdê-lo.

Parabéns.

Larissa Ferraz disse...

Jeane, que o seu marido e os outros escritores do "Evangelho da Graça" me perdoem, mas esse é o melhor texto já postado aqui.

Fui muito abençoada por ele e, particularmente, num momento de grandes decisões e, portanto, bastante delicado para mim.

Vou tentar, seguindo a linha da sua bela reflexão, extrair aprendizados capazes de me fazerem avançar, perseverar e crescer.

Parabéns e obrigado por abençoar tanto o meu início de dia.

Que o Pai continue lhe revelando algumas de suas pérolas eternas.

Eraldo disse...

Mano, gostei muito do blog e dos textos que li, principalmente deste último. Verdadeiro como Jesus. Parabéns a todos do Evangelho da Graça. Estarei sempre visitando. Deus abençõe.

Emiliana Lins disse...

Tudo gerado por Deus, inclusive o sofrimento. nos aproxima, mais cedo ou mais tarde, das coisas mais belas deste mundo e principalmente do que há de vir. Texto maravilhoso.

Parabéns.

Gary disse...

Oi irmão,

acabei de conhecer o seu blog.

Excelente.

Vou indicar para os irmãos da minha igreja daqui de São José do Rio Preto.

Abração.

Alex Malta Raposo disse...

Concordo plenamente com vc, Larissa. "Tesouros no sofrimento" é, sem dúvida alguma, um dos textos mais maduros postados neste espaço.

E isso se dá, entre outras coisas, pela busca das mulheres que, normalmente, é mais apurada do que a dos homens.

Além disso, sensibilidade, sabedoria e equilíbrio sempre estiveram ao lado de vcs.

Mais especificamente, fico feliz com a receptividade que os dois textos escritos por Jeane tiveram. Assim, ela continua me ajudando a manter o blog. Rs.

Obrigado pela visita Gary. Que Deus também abençõe a vc e aos nossos irmãos de São José do Rio Preto.

Abraços a todos.

Jeane Ralile disse...

Larissa: fico grata a Deus pela oportunidade que Ele está me concedendo de aprender mais da sua Palavra. Como vc tb tenho atravessado momentos delicados,turbulentos, nos quais o Senhor tem me levado a reavaliar muitas coisas e, acima de tudo, tem me conduzido para mais perto Dele.

Obrigada mais uma vez pelas palavras carinhosas. Que o Senhor a conduza sempre na tomada de suas decisões. Bjos

Valter Dã disse...

Querido irmão,

Seu blog tá show.

Um dos melhores que já conheci.

Cristo nele!

Jeane Ralile disse...

É verdade Cláudio: queremos atingir a maturidade cristã sem padecer a dor do crescimento (rss). É como a mâxima: todos qurem ir para o céu, mas ninguém querer morrer.

Mas, como bem disse Emiliana, tudo que gerado por Deus é maravilhoso, mesmo o sofrimento. Se nos colocarmos, verdadeiramente nas mãos do Pai, confiantes de que a Sua Vontade é boa, perfeita e soberana, conseguimos passar pela prova se não cantando, mas pelo menos não murmurando.

Um abraço

Jeane Ralile disse...

Eraldo,Gary e Valter: obrigada pela visita. Sinta-se à vontade para participar, sugerir, criticar. Criamos esse espaço para glorificar o nome do Senhor e queremos reunir nele os que O adoram em Espírito e Verdade. Um abraço.

Diogo disse...

Só o fato de nos aproximarmos mais (por mais paradoxal que seja essa afirmação) de Deus quando estamos no deserto de nossas existência já justifica e corrobora esse excelente artigo. Parabéns. Muito abençoador. Grande abraço.

Glauco disse...

Olá,

Gostei do muito do blog.

Os textos e vídeos refletem a beleza do título.